terça-feira, fevereiro 14, 2006

Pura Literatura

“Se por um instante Deus . . . me oferecesse um pouco mais de vida, não diria tudo o que penso, mas pensaria tudo o que digo. Daria valor às coisas, não pelo que valem, mas pelo que significam.
Dormiria pouco, sonharia mais. Entendam que por cada minuto que passa em que fechamos os olhos, perdemos sessenta segundos de luz.
Andaria quando os outros param, acordaria quando os outros dormem. Ouviria quando os outros falam . . .
Se Deus me oferecesse um pouco mais de vida, vestir-me-ia de forma simples, deixando a descoberto, não apenas o meu corpo, mas também a minha alma.
Meu Deus, se eu tivesse um coração, escreveria o meu ódio sobre o gelo e esperaria que nascesse o Sol.
Pintaria com um sonho de Van Gogh sobre as estrelas de um poema de Benefetti, e uma canção de Serrat seria a serenata que ofereceria à lua.
Regaria as rosas com as minhas lágrimas para sentir a dor dos seus espinhos e o beijo encarnado das suas pétalas. . .
Meu Deus se eu tivesse um pouco mais de vida . . . Não deixaria passar um só dia sem dizer às pessoas de quem gosto que gosto delas. Convenceria cada mulher ou homem que é o meu favorito e viveria apaixonado pelo amor.
Aos homens provar-lhes-ia como estão equivocados ao pensar que deixam de se apaixonar quando envelhecem, sem perceberem que envelhecem quando deixam de se apaixonar!!
A uma criança, dar-lhe-ia asas, mas teria de aprender a voar sozinha. Aos velhos, ensinar-lhes-ia que a morte não chega com a velhice, mas sim com o esquecimento.
Tantas coisas pude aprender com vocês, os homens. . .
Aprendi que quando um recém-nascido aperta com a sua pequena mão, pela primeira vez, o dedo do seu pai, o tem agarrado para sempre.
Aprendi que todo o mundo quer viver em cima da montanha, sem saber que a verdadeira felicidade está na forma de subir a encosta.
Aprendi que um homem só tem o direito de olhar outro de cima para baixo quando vai ajudá-lo a levantar-se.
São tantas coisas que pude aprender com vocês, mas não me hão-de servir de muito, porque quando me guardarem dentro dessa maleta, infelizmente estarei morto.”

Gabriel Garcia Marquez

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